Drogas são usadas no diagnóstico, tratamento ou prevenção de doenças. Sua administração pode causar reações adversas inesperadas, envolvendo diferentes órgãos ou sistemas. As manifestações cutâneas são as mais comuns, assumindo múltiplos aspectos clínicos, desde lesões solitárias até quadros generalizados e fatais. O uso de drogas cresce progressivamente e estima- se que de 5% a 15% dos pacientes tratados com algum medicamento desenvolvam reações cutâneas medicamentosas (RCM),que assumem diferentes padrões clínicos, como urticária/angioedema; reações exantemáticas; eritema multiforme;erupção fixa a droga;lesões vesicobolhosas;necrólise epidérmica tóxica (NET) ou síndrome de Lyell;lesões ulceronecróticas; fotossensibilidade.

A incidência de reações medicamentosas em pacientes hospitalizados varia de 10 a 30%, e, destes, 2% a 3% têm reações cutâneas. Tais reações freqüentemente não são graves, mas podem determinar morbidade. As graves são, principalmente, síndrome de Stevens-Johnson e NET, sendo fatais em 0,1% dos pacientes clínicos e 0,01% dos cirúrgicos, necessitando de internação hospitalar, às vezes em unidades de terapia intensiva ou de queimados. A diferenciação de RCM graves e menos graves pode ser difícil, porém é essencial, sendo a retirada da droga suspeita a ação mais importante para reduzir a morbidade.

Dadas a escassez de artigos publicados e a alta incidência das RCM, este trabalho tem o propósito de apresentar levantamento retrospectivo dessas reações ocorridas num hospital terciário, bem como elencar as drogas envolvidas e os tipos de reações mais freqüentes. Pesquisadores da Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp) realizaram um estudo retrospectivo e descritivo, no qual analisaram prontuários de pacientes da enfermaria de dermatologia de um hospital terciário, com diagnóstico inicial de RCM, no período de janeiro/1999 a junho/2004. O critério de inclusão foi o diagnóstico clínico de farmacodermia com algum tipo de medicamento potencialmente envolvido descrito na história clínica.

Pacientes cujos exames anatomopatológicos confirmaram afecção de causa não medicamentosa foram excluídos. Foram avaliados: idade, sexo, raça, grupo de medicamentos em uso (anticonvulsivantes, antibióticos, antiinflamatórios, anti-hipertensivos, hipoglicemiantes orais ou insulina, analgésicos/ antipiréticos, poliquimioterapia, cardiotônicos, benzodiazepínicos/ ansiolíticos, antidepressivos, outros), droga suspeita, doenças associadas (hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca, diabetes mellitus, epilepsia, outras), apresentação clínica da RCM (exantema maculopapular, eritrodermia, síndrome de Stevens- Johnson, urticária, eritema polimorfo, eritema nodoso, eritema pigmentar fixo, outros), diagnóstico histopatológico (farmacodermia, síndrome de Stevens- Johnson, eritema pigmentar, urticária, eritema polimorfo, eritema nodoso), tratamento (corticóide sistêmico, anti-histamínico, medicamento tópico, antibiótico sistêmico, suspensão do medicamento, hiperidratação) e evolução (melhora, cura, recorrência, óbito). 

Os resultados mostram que dos 121 pacientes, cujos prontuários foram estudados, 43 (35,5%) foram confirmados como sendo casos de farmacodermia, sendo, por conseguinte, incluídos no estudo para análise. Os demais prontuários (78), apesar da suspeita inicial de possível reação cutânea a drogas, tiveram, como diagnóstico final, 19 casos de eritemas polimorfo e nodoso de causa não medicamentosa (24,3%), 14 casos de psoríase (17,9%), 13 casos de dermatite de contato (16,6%), seis casos de urticária de causa não medicamentosa (7,7%) e 12 casos com outros diagnósticos variados (15,4%), a saber: celulite, hanseníase, síndrome de Sweet, porfiria cutânea, paracoccidioidomicose, exantema infeccioso, lúpus eritematoso sistêmico, pênfigo e micose fungóide. A idade média dos pacientes foi de 43,9 ± 21,6 anos (variando entre 12 e 99 anos).

O sexo feminino foi o mais acometido (51,2%), em comparação com o masculino (49,8%). Quanto à raça, 86% dos pacientes eram brancos, 4,7%, negros, e 9,3%, pardos. Observou-se que 48,8% dos pacientes acometidos por reações cutâneas adversas desencadeadas por drogas utilizavam apenas uma medicação que pudesse estar relacionada à etiologia do quadro dermatológico. Dos 51,2% que utilizavam mais de uma medicação, 20,9% faziam uso de duas drogas, 16,3%, de três drogas, 9,3%, de quatro drogas, e 4,7%, de cinco drogas.

Quanto aos grupos de medicamentos em uso pelos pacientes com farmacodermias, encontraram-se: antibióticos (20,9%); analgésicos/antipiréticos (16,3 %), antiinflamatórios (12,8%), anti-hipertensivos (11,6%), anticonvulsivantes (9,3%) e outros grupos de drogas (cardiotônicos, antidepressivos, ansiolíticos, antieméticos, hipoglicemiantes/insulina, poliquimioterapia) (29,1%). Os principais medicamentos suspeitos pela farmacordermia foram: antibióticos (33,3%), antiinflamatórios (16,7%), anticonvulsivantes (13%), analgésicos/ antipiréticos (13%) e outros (24%). Na casuística, os tipos de apresentação clínica mais freqüentes foram: exantema maculopapular em 41,9% dos pacientes, eritrodermia (25,6%), urticária (23,3%) e eritema polimorfo (9,3%). Apenas dois pacientes (4,5%) apresentaram a forma clínica da síndrome de Stevens-Johnson. As principais doenças associadas aos indivíduos que desenvolveram RCM foram: hipertensão arterial (25,6%), epilepsia (7%), insuficiência cardíaca congestiva (7%), diabetes mellitus (4,7%); 15 pacientes (34,9%) não apresentavam quaisquer comorbidades. 

Redator responsável:
Dr. Darcy Roberto Lima, PhD – CRM 5241326-9/RJ
Fonte: Silvares, M.R.C; Abbade, L.P.F; Lavezzo, M.; Goncalves, T.M. & Abbade, J.F.: Reações cutâneas desencadeadas por drogas. An Bras Dermatol. 2008;83(3):227-32.